"(...) se aceitarmos a realidade na minúcia completa das suas discordâncias e singularidades, sem querer mutilar a impressão vigorosa que deixa, temos de renunciar à ordem, indispensável em toda investigação intelectual. Esta só se efetua por meio de simplificações, reduções ao elementar, à dominante, em prejuízo da riqueza infinita dos pormenores. É preciso, então, ver simples onde é complexo, tentando o demonstrar que o contraditório é harmônico. O espírito de esquema intervém, como forma, para traduzir a multiplicidade do real; seja a forma da arte aplicada às aspirações da vida, seja a da ciência, aos dados da realidade, seja a da crítica, à diversidade das obras. E se quisermos reter o máximo de vida com o máximo de ordem mental, só resta a visão acima referida, vendo na realidade um universo de fatos que se propõem e logo se contradizem, resolvendo-se na coerência transitória de uma unidade que sublima as duas etapas, em equilíbrio instável."

CANDIDO, Antonio. Formação da literatura brasileira. Editora Itatiaia, 2000, p. 30.