ALTERIDADE

Quando Emerson diz "O povo, e não a universidade, é o lar do escritor", poucos parecem entendê-lo.

Por que lemos? Samuel Johnson: "A leitura deve atender à uma preocupação central, algo que nos diz respeito, e que nos é útil".

Francis Bacon: "Não leia com o intuito de contradizer ou refutar, nem para acreditar ou concordar, tampouco para ter o que conversar, mas para refletir e avaliar."

"Sem dúvida, o prazer da leitura é pessoal, não social", diz Harold Bloom, e continua:

"Não tentar melhorar o caráter do vizinho, nem da vizinhança, através do que lemos ou de como o fazemos. O auto-aperfeiçoamento é projeto suficientemente grandioso para ocupar a mente e o espírito: não existe a ética da leitura."

E se existe a estética, que ela nos seja pessoal. E que jamais seja imposta (ao próximo ou a si mesmo).

Mistificar a leitura, cultuar os livros, isso tudo é recalque, ignorância.

Se alguns acreditam que Paulo Coelho ou Dan Brown não escrevem literatura ("O que é literatura": discussão datada e hoje completamente irrelevante), não há aí motivo algum de não lê-los. Afinal, não se critica quem lê gibis, revistas, jornais.

O sucesso estrondoso de ambos Paulo CoelhoDan Brown seria uma indicação de que a humanidade estancou na mediocridade? Será mesmo que o leitor destes autores não lê nada além de tais autores?

A literatura não interessa muito. O que interessa é ler. Vamos 'livrar a mente da presunção', como pede Johnson. O que nos interessa é anamnese, é reflexão, é nos avaliarmos através da leitura, a leitura que nos apraz.

Emerson diz que "Para ler bem é preciso ser um inventor". Sejamos inventivos com Paulo Coelho ou Thomas Mann. Tenhamos a liberdade de escolha, e se escolhermos ambos, que sejamos lembrados pela pluraridade e não pela mediocridade creditada à leitura de um ou dois escritores. Tenhamos também o sossego de não ouvirmos pessoas que acreditam saber o que a humanidade deve ler - sobretudo quando elas não estão abertas a discutirem sobre o assunto.

(De que adianta alguém dizer que não lê Dan Brown mas continua sendo medíocre lendo William Faulkner?) 

"Literatura de ficção é alteridade." Harold Bloom

Liberdade é alteridade, sabedoria é alteridade.
Preconceito, presunção, pedantismo, não.

André Rebelo